Pesquisar:

 

 

 

 

II - Achegas para um Dicionário da República Portuguesa


A LIBERDADE (*)

«Um mês depois de proclamada a República, a situação política não parece tão assegurada, nem tão certa a liberdade moral dos cidadãos, como a princípio prometiam os discursos dos ministros e o porta-voz optimista das suas gazetas. (…) § É o que pelo menos se infere da prisão do antigo presidente do conselho, João Franco chefe dos thalassas, efectuada hoje na sua quinta de Sintra, e a sua trazida ao tribunal da Boa Hora, donde saiu apupado e perseguido por uma escolta daquela turba-multa das ruas que, segundo parece, é quem governa e dirige as acções do governo republicano. (…) § Seis dias antes da prisão de João Franco em Sintra, tinha-se dado a do jornalista Homem Cristo, incisivo director do Povo d’Aveiro, e a suspensão imediata deste jornal, de que se vendiam cerca de vinte mil exemplares, e que tão violentas campanhas fez contra os republicanos, fora e dentro do governo. (…) § Se conjugarmos estes actos, tão indicativos como amostra, com os das espionagens que o governo autoriza sejam feitas por alcateias de populares, sem investidura legal nem competência policial de nenhuma espécie, aos cidadãos que essas mesmas alcateias tomam de ponta; e ainda por cima destes atropelos da liberdade e da segurança pessoal, repararmos nas demissões em massa, de funcionários antigos, alguns cheios de serviços, havemos de convir que afinal o começo deste regime novo cheira diabolicamente ao fim do velho, e que os puritanos e amigos de puritanos, cunhados de puritanos e primos de puritanos, tudo afinal são roedores de apetite voraz (…)».

ALMEIDA, Fialho d’ – Saibam quantos… (cartas e artigos políticos). Lisboa: Livraria Clássica Editora, 1912, pp. 5-8

(*) O tema e a descrição do mesmo são, afinal, e como o leitor pode constatar, de uma actualidade flagrante.

Nuno Resende