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Repressão da Imprensa “Operária”


Cabecalho - Jornal A Batalha 

O jornal “A Batalha”, Porta-voz da Organização Operária Portuguesa, foi fundado em 1919. A sua vida ficou assinalada por conflitos constantes com o poder.
Em meados de Março de 1920 as instalações de “A Batalha” foram fechadas por ordem do governo, mas o jornal continuou a publicar-se. Em 21.3.1920 anunciava: “As oficinas de A Batalha foram ontem reabertas”, acrescentando ironicamente: “Foram encarregados desta missão dois chefes de polícia, um deles o da esquadra das Mercês, que se houveram com toda a delicadeza”. Nos meses seguintes, foi vítima de novas investidas do governo, que assinalou com duras críticas:

25.3.1920: “A Batalha apreendida. Porquê? A Batalha foi ontem apreendida à ordem do governo… o direito de crítica aos actos dos detentores do poder é vedado àqueles dos jornais que se não colocam de cócoras perante eles… O presidente do ministério que, não há muitos dias, fez uma tentativa para amordaçar A Batalha, recorre agora, conduzido pela mão reaccionária do grande Liberato à apreensão… sob o pretexto de que este jornal, nos dois últimos dias, tem usado duma linguagem despejada!”

27.3.1920: “A Batalha, O Combate e outros jornais que não batem palmas à acção inepta e retrógrada do coronel são apreendidos diariamente… o governo, que nestes últimos três dias não conseguira impedir que este jornal circulasse largamente, apesar das medidas coercivas que adoptara, vem de intimar o proprietário da máquina onde A Batalha é impressa a enviar o primeiro exemplar à censura, sob pena daquele individuo ser preso, intimando-o simultaneamente a não deixar sair para a venda quaisquer exemplares sem prévia autorização da polícia”.
Em consequência destas ameaças, suspendeu-se a publicação do jornal por 10 dias. Na primeira semana de Abril voltava a publicar-se, com esta nota:

 6.4.1920: “A um delegado da Associação dos compositores tipográficos que no sábado procurou saber do inclito presidente do ministério se “A Batalha” e “O Combate” estavam ou não impedidos de circular, respondeu o secretário daquele ministro, em nome deste, que “A Batalha” e “O Combate” podiam publicar-se desde que não inserissem:

Incitamentos à greve;
Ataques aos poderes constituídos;
Matéria subversiva;
Falta de respeito à autoridade;
Linguagem despejada;”

25.4.1920 – “Desde terça-feira da semana passada que A Batalha se encontrava suspensa. Tendo nós enviado para a máquina o número correspondente a esse dia, a polícia de segurança do Estado, depois de haver exercido a censura sobre esse número, como a tem exercido diariamente, impediu que ele circulasse com a mesma sem-cerimónia com que o havia feito anteriormente. Em face de tão arbitrário procedimento, que é tudo quanto há de mais inédito na série, já larga, de violências governamentais, deliberámos suspender novamente A Batalha, uma vez que é evidente o propósito do governo de amordaçar este jornal, que decididamente não está disposto a por as suas colunas ao seu serviço. A Batalha reaparece hoje mas continua sob ameaça das perseguições governamentais”.

Memurandum A Batalha

Nos princípios de Maio, “A Batalha” publicava ao alto da página, dentro de uma moldura, o seguinte MEMORANDUM:

“No ano da graça de mil novecentos e vinte (da era cristã), sob o regime da República, a qual, no artigo 13º da respectiva constituição política, votada aos dezanove de junho de mil novecentos e onze, estatui que a expressão do pensamento, seja qual for a sua forma, é completamente livre, sem dependência de caução, censura ou autoridade prévia; presidindo às instituições republicanas o cidadão doutor António José de Almeida, antigo jornalista; sendo presidente do ministério o coronel de infantaria António Maria Baptista e ministros (…) não estando suspensas as garantias constitucionais e funcionando as câmaras dos deputados e senado – exerce-se a censura sobre o jornal operario A Batalha, órgão, na imprensa, da Confederação Geral do Trabalho de Portugal, e também sobre alguns outros jornais diários – não todos os que se publicam em Lisboa – censura de que se desempenha um agente da policia de segurança do Estado, na respectiva repartição do governo civil.

Para que bem possa ser exercida a referida censura é diariamente cercada por polícias civicos e da segurança do Estado a casa da máquina onde A Batalha é impressa e logo que a supracitada máquina é posta em movimento vai um dos agentes da segurança exigir do impressor um exemplar, parando em seguida a máquina, que só pode fazer a impressão do jornal quando o censor, por escrito, ordena a sua livre circulação. Se, porém, o supramencionado censor, na plenitude dos latos poderes que o governo lhe confere, entende, no seu esclarecido critério, que o jornal não deve circular, assim o faz sentir verbalmente ao representante do proprietário da máquina de impressão, sendo, após essa ordem, invadida a mesma oficina pela polícia, que passa rigorosa busca às suas dependências, apreendendo quaisquer exemplares que encontra.

Tudo isto se faz sem protesto, antes por indicação do poder executivo, com o consenso de todos os outros poderes do Estado, o legislativo e o judicial, devendo acrescentar-se que quando o deputado Augusto Dias da Silva, na sessão de vinte e dois de Abril, pretendia, em negócio urgente, que a câmara a que pertence tratasse de apreciar a situação da imprensa atingida por tam singulares medidas, todos os “representantes do povo soberano”, menos vinte e um, receberam, em coro, tal proposta com a interjeição desdenhosa de: “Ora, ora!”

Este Memorandum foi publicado em várias edições do jornal, durante o mês de Maio. Em 21 desse mês A Batalha publicava uma longa “Carta Aberta ao Sr. Presidente da República”, do jornalista Gonçalves Correia, que estava preso por delitos da pena: “a minha prisão representa o mais lamentável desprezo pela constituição da República, desta república que eu, tam ingenuamente, ajudei a fundar”, lamentava-se o preso político.

Carlos Bobone